Aprenda a Tocar Cabocla Tereza

Considerada uma das melhores músicas de Tonico e Tinoco, a canção ganhou fama na voz dos artistas apesar de não ter sido composta pela dupla. Para quem curte uma moda de viola a música Cabocla Tereza não pode faltar no repertório. Portanto, aprenda a tocar essa canção que marcou o sertanejo brasileiro e conheça mais sobre a história e o autor da música. Confira!

 

Aprenda a Tocar Cabocla Tereza

 

Se você nunca parou para prestar atenção na letra da canção, a hora é agora!

 

Declamado:

Lá no arto da montanha,

Numa casa bem estranha

Toda feita de sapê,

Parei uma noite o cavalo

Pra mor de dois estralo

Que eu ouvi lá dentro batê.

Apiei com muito jeito,

Ouvi um gemido perfeito

Uma voz cheia de dor:

” – Vancê, Tereza, descansa,

Jurei de fazê vingança

Pra mor de meu amor.”

Pela réstia da janela,

Por uma luizinha amarela

Dum lampião apagando

Vi uma cabocra no chão

E um cabra tinha na mão

Uma arma alumiando.

Virei meu cavalo a galope,

Risquei de espora e chicote,

Sangrei a anca do tá.

Desci a montanha abaxo

Galopeando meu macho,

Seu dotô fui chamá.

Vortemo lá pra montanha,

Naquela casinha estranha

Eu e mais seu dotô.

Topemo um cabra assustado

Que chamando nóis prum lado

A sua história contô:

 

Cantado:

” – Há tempo fiz um ranchinho

Pra minha cabocla morá,

Pois era ali nosso ninho

Bem longe deste lugá.

No arto lá da montanha,

Perto da luiz do luá,

Vivi um ano filiz

Sem nunca isto esperá.

E muito tempo passô

Pensando em ser tão feliz,

Mas a Tereza, dotô,

Felicidade não quis.

Puis meu sonho neste oiá,

Paguei caro o meu amô,

Pra mor de outro caboclo

Meu rancho ela abandonô.

Senti meu sangue fervê,

Jurei a Tereza matá,

O meu alazão arriei

E ela eu fui percurá.

Agora já me vinguei,

É este o fim dum amô.

Esta cabocla eu matei

É a minha história dotô.”

 

Momento da História

 

aprender a tocar cabocla Tereza na viola caipiraOs anos 1940 se iniciaram já como um período marcante para toda a humanidade, devido, sobretudo à Segunda Guerra Mundial. Politicamente o mundo vivenciou muitos momentos de assombro e incertezas, e isso se refletiu nos demais âmbitos da vida.

Em um mundo entre ondas de Estados autoritários e Estados de bem-estar social, sob os olhos auspiciosos de desenvolvimento econômico, nos deparamos com a beleza e a dor da guerra, de uma infinidade de novidades em produtos industrializados, próprios de uma cultura pautada no consumo inspirada no “american way of life”, às mortes horrendas.

O ano de 1940 também é marcado como o início da grande popularização da música sertaneja no país. E nesta década que a música caipira se consolida como expoente vertente da cultura popular do Brasil, com a popularização das duplas: Zé Carreiro e Carreirinho, Cascatinha e Inhana, e Tonico e Tinoco.

 

História da Música Cabocla Tereza

 

A música “Cabocla Tereza” é um poema dramático escrito por João Pacífico e Raul Torres, em 1940, que se tornou um dos maiores sucessos da Moda Caipira na voz de Tonico e Tinoco.

Os dois compositores foram criadores do gênero “Toada Histórica”, o famoso “falar e cantar”, onde a ideia era contar histórias dentro de uma música. Tudo começou em 1937 com a música Chico Mulato, que tinha esse estilo de composição.  A partir daí ele percebeu que o público se interessava pelo enredo narrado na letra e curtia também a melodia que a acompanhava.

Porém, devido a limitações técnicas, quase não teríamos registro histórico sobre esta nova forma de se fazer música.

aprender a tocar cabocla Tereza na viola caipiraA tecnologia utilizada para a gravação de discos entre 1913 e 1950 era o formato conhecido como 78 rotações, que tinha este nome porque indicava a quantidade de voltas que o disco dá em um minuto. Passou a ser utilizado como padrão de mídia, em vitrolas movidas a manivela. A capacidade de armazenamento da mídia era cerca de 3 minutos em cada lado do disco.

Ambas as músicas originalmente tinham mais do que três minutos, então coube a um grande visionário viabilizar o meio para que esta obra fosse registrada.

O presidente da gravadora RCA Victor no Brasil, Sr. Evans, gostou tanto do novo ritmo que tratou de dar um jeito para fazer a música caber no formato.  Cortou parte da orquestração aqui, apertou um pouquinho ali até que a música coubesse toda de um lado do disco e ainda incentivou João Pacifico a escrever novas músicas no mesmo estilo.

E em 1940, nascia a trama da cabocla que se tornou uma das canções mais clássicas do sertanejo antigo!

Uma curiosidade interessante é que foi a primeira vez em que o compositor matou um de seus personagens em uma canção.

Como se fosse um folhetim ou uma notícia de jornal, Pacífico e Torres criaram uma história com início, meio e fim para escritor nenhum colocar defeito. A introdução declamada cria um clima de intimismo, configurando certa solidão e sentimentalismo, familiar ao romantismo.

A segunda parte é a “toada” propriamente dita, melancólica e vagarosa. Na forma de discurso direto, o cantor empresta sua voz para que o ex-companheiro de Tereza conte ao doutor e ao personagem-cantador os motivos que o levaram a assassinar Tereza.

Na história do Caboclo e Tereza, deixando de lado os conceitos de acusado e vítima, existe a história de um casal apaixonado, uma casinha lá no alto da montanha (perto da luz do luar), uma traição, ódio, sangue fervendo nas veias, vingança e morte, pois Tereza “não quis” a felicidade, preferindo a companhia de outro caboclo.

Dessa forma, tomado pelo ciúme, pela possessividade e pelo sentimento de rejeição, ele praticou um ato de feminicídio e confessou o crime.

A primeira gravação de “Cabocla Tereza” foi feita pelo Raul Torres (proseado) e Florêncio (parte cantada), é até hoje ainda gravada. Tonico e Tinoco, Sérgio Reis, Chitãozinho e Xororó, Fábio Jr e Rolando Boldri são apenas alguns artistas que regravaram Cabocla Tereza, uma das músicas mais famosas e queridas pelos fãs de sertanejo.

aprender a tocar cabocla Tereza na viola caipiraMas o sucesso não se limitou ao meio musical. O enredo de Cabocla Tereza também ganhou um filme homônimo, lançado em 1980, no qual o Caboclo também teria matado o outro Caboclo que teria levado Tereza embora e seriam surpreendidos em uma tapera.

Este filme foi dirigido e estrelado por Sebastião Pereira, com Zélia Martins no papel de Tereza, participação especial de Jofre Soares e o próprio João Pacífico compôs uma trilha sonora inédita para o longa.

O mais impressionante de Cabocla Tereza é que ela é uma música atemporal e ainda retrata muitas situações ocorridas hoje em dia.

O que é uma pena porque, apesar de que para o Direito Penal pouco importa a cor da luz do luar em um ranchinho lá no alto da montanha ou o que seria a felicidade para o homem que carrega sua mulher para este lugar, passados tantos anos da sua primeira gravação, esse crime já deveria ter ficado restrito às músicas antigas.

 

Quem são os Compositores?

 

Como vimos acima, a música Cabocla Tereza foi composta por João Pacifico (Letra) e Raul Torres (Música).

 

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João Pacifico

João Pacifico é o nome artístico de João Baptista da Silva, que nasceu em Cordeirópolis, interior do estado de São Paulo, no dia 05 de agosto de 1909.

Teve seu primeiro contato com música ainda criança, quando morando em Limeira-SP, viu a apresentação de um grupo de teatro de revista e se encantou pela bateria que era tocada pela banda. Depois de muito insistir, conseguiu algumas lições de como tocar o instrumento com os artistas.

Mas a paixão de João era escrever versos, onde conseguia revelar sua alma cabocla.

Aos dez anos, mudou-se para Campinas-SP, quando sua mãe foi trabalhar na casa de Ana Gomes, irmã do maestro Carlos Gomes. Neste período passou a ter contato com músicos da cidade grande.

 

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Raul Torres

Raul Torres é o nome artístico de Raul Montes Torres, que nasceu em Botucatu, interior do estado de São Paulo, no dia 11 julho de 1906.

Começou a carreira como cantor em sua cidade natal, cantando músicas caipiras em festas.

Torres começou a cantar profissionalmente a partir dos anos 20, quando se mudou para São Paulo. Na capital paulista fez parte de um grupo chamado Turunas Paulistas, cantando Sambas e Emboladas (ritmo parecido com o “repente” que teve origem no nordeste brasileiro).

Foi somente em 1927 que se dedicou a tocar modas de viola, quando foi contratado pela rádio Educadora de São Paulo.

João Pacifico foi apresentado à Raul Torres por meio do escritor e poeta modernista Guilherme de Almeida. Vivendo em campinas, João trabalhava como ajudante de lava pratos no restaurante da Cia Paulista de Estrada de Ferro.

Todos na companhia conheciam a fama que João tinha de poeta e escritor de versos. Certa vez, o cozinheiro pediu que João lhe desse alguns versos que havia escrito, pois entregaria à Guilherme de Almeida, que era viajante frequente e estava a bordo do trem.

O escritor gostou do que leu e mandou entregar a João um cartão de visitas, pedindo que o procurasse na Rádio Cruzeiro do Sul em São Paulo, onde era Diretor.

João Pacifico então se dirigiu à rádio e foi recepcionado pelo próprio Guilherme de Almeida, que o apresentou à Paraguassú (nome artístico de Roque Ricciardi), um dos cantores paulistas de maior cartaz na época.

João mostrou a Paraguassu uma canção em ritmo de embolada que havia escrito, chamada Seu João Nogueira. Paraguassu não se interessou pela música, alegando não ser o tipo de canção que se adequasse ao estilo que cantava e sugeriu que procurasse Raul Torres, cantor e apresentador de programas na rádio que tinha gravado emboladas no início da carreira. Raul gostou do que viu e gravou a canção em janeiro de 1935 pela gravadora Odeon.

A partir daquele momento teve início a carreira artística de João Pacifico. Após a gravação deste disco, passou a escrever e a gravar outras músicas, inclusive em outros ritmos, como marchinhas e valsas.

Raul Torres e João Pacifico escreveram cerca de 40 músicas em parceria, como por exemplo “Pingo D’agua”.

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